Cidade turca e bandido carioca
O noticiário dos últimos meses, pós-filme Cavaleiro das Trevas, confirma uma velha tese minha, a de que Batman se tornou um símbolo prá lá de universal, quase atávico, depois desses quase 70 anos de sucesso. O nome da cidade turca Batman é uma associação normal, que fica ainda mais curiosa em tempos globalizados e com suas autoridades oportunistas. No Brasil, as infames e rotineiras manchetes policiais, sobretudo as do Rio, vêm tratando há semanas das peripécias do criminoso Batman. Fazer a ligação do marginal com o herói dos quadrinhos também é natural. Mas são duas referências "reais" que não refletem em nada a essência do Homem-Morcego. Apenas estão unidas a ele pelo simples fato de compartilharem o mesmo nome ou apelido. Vejamos essa interessante e bem-elaborada análise feita por um colunista do maranhense Jornal Pequeno...
COLUNA EUDES ALENCAR
eudesalencar@hotmail.com - 23 de novembro de 2008
Duas notícias inusitadas geraram a crônica de hoje: a primeira foi publicada no dia 7de novembro no caderno Ilustrada, da Folha de São Paulo, com o título Cidade quer direitos por uso do nome Batman: “A cidade turca Batman, ao sul do país, quer cobrar de Christopher Nolan, diretor de “Batman: O Cavaleiro das Trevas”, direitos autorais pelo uso do nome da localidade no filme. O prefeito Huseyin Kalkan declarou que o nome Batman pertence à cidade. Segundo ele, o governo local já trabalha com advogados para processar quem utilizar o nome sem autorização prévia”.
Já o jornal O Dia, trouxe a seguinte notícia - Polícia: fuga de Batman custou R$ 1 mi a milicianos: “ O delegado Marcus Neves, titular da 35ª Delegacia de Polícia (Campo Grande), afirmou que milicianos presos em Bangu 8, no Rio de Janeiro, teriam gasto R$ 1 milhão para financiar a fuga do ex-policial militar Ricardo Teixeira Cruz, conhecido como Batman, que integraria a milícia Liga da Justiça. Os suspeitos do rateio são Luciano Guinâncio Guimarães, o vereador licenciado Jerominho, o deputado Natalino Guimarães e o ex-PM Fabinho Gordo. O próprio Ricardo Batman teria pago pela fuga.”
O prefeito da cidade turca de Batman, de nome impronunciável, menos ainda escrevê-lo, já que o computador se recusa a colocar os caracteres na seqüência certa, vamos chamá-lo de Turco, processará Hollywood. Eis como a história se passou. O que vocês não sabem é que ele ameaça processar o Rio de Janeiro também.
A reunião fora marcada pelo prefeito com certa urgência e algum estardalhaço. A cidade esperava uma resposta. Na verdade, de empregos, assistência hospitalar, educação, estas coisas comezinhas que o povo tem mania de desejar para si. Uma impertinência, sem dúvida.
O diabo é que a região amargava uma maré do azares e pouco crescimento. Onde estava o dinheiro para os investimentos? Como cumprir a montanha de promessas? Naquelas condições estava difícil sair às ruas. Havia que sacar uma solução mirabolante, algo mágico para se safar de uma possível bomba, um linchamento ou coisa pior, que é como o povo por lá resolve estas questões.
A reunião com os secretários fora muito tensa. Todos a uma falavam a mesma coisa: a crise mundial reduziu a arrecadação e o governo central, com propostas para arrumar a casa – PAC acenou com más notícias, não abre a carteira, vai primeiro socorrer os bancos. Ora, isso ele já sabia. Exasperado, perguntou: e nós, a gente que se dane? E minha carreira política e o sonho de ser governador, presidente? Se eu não fizer nada, vai todo mundo para o espaço. Falava da equipe. Êpa, tive uma idéia, esta coisa de espaço pode render alguma coisa. Espaço é o ambiente de vôo, voar lembra o Batman, o herói morcego, cujo filme arrecadou mais de um bilhão de dólares. Batman é o nome de nossa região - estacou como a criar suspense.
Os colaboradores se assanharam, embevecidos por tanta esperteza. Olhavam para o prefeito como se fosse um Moisés declarando uma nova terra prometida. O discurso inflou-se de nacionalismos e megalomania. À medida que falava, percebia-se a crescente emoção na fala, os esgares faciais diziam, estava tomado de emoção. Vamos processar Hollywood por uso indevido do nome Batman! Nós ainda éramos chamados de mouros e já se usava esse nome. É mais velho que nosso glorioso império turco. Vocês sabiam?
Os auxiliares se entreolharam. Não se sabia se por incredulidade pela proposta louca ou por ignorância. O prefeito interveio: Vamos ganhar um monte de dinheiro. É a solução para os problemas da cidade e quiçá de todo o estado de Batman. Já imaginaram? Vou construir uma caverna e dizer que ali nasceu o primeiro morceguinho metido a homem. Estou até vendo: o bercinho pendurado no teto, os cueiros, a primeira asinha de leite...
No meio da reunião, um assessor pediu a palavra, meio que temeroso por atalhar aquela empolgação do alcaide. Prefeito, eu li na internete que o Batman está morando no Brasil. O quê?!. Digo mais: trabalhou na polícia do Rio de Janeiro. Foi preso por causa de algumas travessuras delinqüentes com um grupo de ex-companheiros da polícia à qual serviu. Um pequeno deslize, coisa perdoável. Fez como civil, inclusive sem os aparatos que o identificam.
O prefeito ficou numa saia justa. Planejava sair da reunião com a proposta amarrada, além do comício que pretendia fazer para divulgar à população como enfrentariam, mesmo de um fim de mundo daqueles, os poderosos americanos e ainda por cima o Batman, herói poderoso e muito astuto. Mas aquilo era inusitado. O Brasil, sabia assim de ouvir falar, era um país em algum lugar do continente americano ou da África? Lembrava de umas mulatas rebolando, futebol e que mais? O resto não seria só floresta? Isso complicava um pouco os planos. Será que o Batman cansou daquela escuridão de Gotham City?
O prefeito, recuperado do susto, bradou: processaremos também o Rio. Com esta decisão, a história se encaminhou para processar o Brasil, o Rio e quem mais fosse. Outro assessor sugeriu que uma comissão fizesse viagem até o Rio para conhecer o Batman. Mesmo que alguém tivesse dito que ele estava foragido, o prefeito nem ouviu. Sugeriu com entusiasmo, lembrando-se das mulatas, uma nova moção: organizaremos uma comissão especial que será enviada à cidade, para convidar o Batman para passar uma temporada na cidade. Quem sabe se ele levar umzinho não se anima e fica do nosso lado? Vamos chamar a atenção, melhorar o turismo, e fazer inveja. Vai ser nossa kriptonita contra a nossa decrépita cidade vizinha, chamada Superman.
Fonte: www.jornalpequeno.com.br (São Luís, Maranhão)
COLUNA EUDES ALENCAR
eudesalencar@hotmail.com - 23 de novembro de 2008
Duas notícias inusitadas geraram a crônica de hoje: a primeira foi publicada no dia 7de novembro no caderno Ilustrada, da Folha de São Paulo, com o título Cidade quer direitos por uso do nome Batman: “A cidade turca Batman, ao sul do país, quer cobrar de Christopher Nolan, diretor de “Batman: O Cavaleiro das Trevas”, direitos autorais pelo uso do nome da localidade no filme. O prefeito Huseyin Kalkan declarou que o nome Batman pertence à cidade. Segundo ele, o governo local já trabalha com advogados para processar quem utilizar o nome sem autorização prévia”.
Já o jornal O Dia, trouxe a seguinte notícia - Polícia: fuga de Batman custou R$ 1 mi a milicianos: “ O delegado Marcus Neves, titular da 35ª Delegacia de Polícia (Campo Grande), afirmou que milicianos presos em Bangu 8, no Rio de Janeiro, teriam gasto R$ 1 milhão para financiar a fuga do ex-policial militar Ricardo Teixeira Cruz, conhecido como Batman, que integraria a milícia Liga da Justiça. Os suspeitos do rateio são Luciano Guinâncio Guimarães, o vereador licenciado Jerominho, o deputado Natalino Guimarães e o ex-PM Fabinho Gordo. O próprio Ricardo Batman teria pago pela fuga.”
O prefeito da cidade turca de Batman, de nome impronunciável, menos ainda escrevê-lo, já que o computador se recusa a colocar os caracteres na seqüência certa, vamos chamá-lo de Turco, processará Hollywood. Eis como a história se passou. O que vocês não sabem é que ele ameaça processar o Rio de Janeiro também.
A reunião fora marcada pelo prefeito com certa urgência e algum estardalhaço. A cidade esperava uma resposta. Na verdade, de empregos, assistência hospitalar, educação, estas coisas comezinhas que o povo tem mania de desejar para si. Uma impertinência, sem dúvida.
O diabo é que a região amargava uma maré do azares e pouco crescimento. Onde estava o dinheiro para os investimentos? Como cumprir a montanha de promessas? Naquelas condições estava difícil sair às ruas. Havia que sacar uma solução mirabolante, algo mágico para se safar de uma possível bomba, um linchamento ou coisa pior, que é como o povo por lá resolve estas questões.
A reunião com os secretários fora muito tensa. Todos a uma falavam a mesma coisa: a crise mundial reduziu a arrecadação e o governo central, com propostas para arrumar a casa – PAC acenou com más notícias, não abre a carteira, vai primeiro socorrer os bancos. Ora, isso ele já sabia. Exasperado, perguntou: e nós, a gente que se dane? E minha carreira política e o sonho de ser governador, presidente? Se eu não fizer nada, vai todo mundo para o espaço. Falava da equipe. Êpa, tive uma idéia, esta coisa de espaço pode render alguma coisa. Espaço é o ambiente de vôo, voar lembra o Batman, o herói morcego, cujo filme arrecadou mais de um bilhão de dólares. Batman é o nome de nossa região - estacou como a criar suspense.
Os colaboradores se assanharam, embevecidos por tanta esperteza. Olhavam para o prefeito como se fosse um Moisés declarando uma nova terra prometida. O discurso inflou-se de nacionalismos e megalomania. À medida que falava, percebia-se a crescente emoção na fala, os esgares faciais diziam, estava tomado de emoção. Vamos processar Hollywood por uso indevido do nome Batman! Nós ainda éramos chamados de mouros e já se usava esse nome. É mais velho que nosso glorioso império turco. Vocês sabiam?
Os auxiliares se entreolharam. Não se sabia se por incredulidade pela proposta louca ou por ignorância. O prefeito interveio: Vamos ganhar um monte de dinheiro. É a solução para os problemas da cidade e quiçá de todo o estado de Batman. Já imaginaram? Vou construir uma caverna e dizer que ali nasceu o primeiro morceguinho metido a homem. Estou até vendo: o bercinho pendurado no teto, os cueiros, a primeira asinha de leite...
No meio da reunião, um assessor pediu a palavra, meio que temeroso por atalhar aquela empolgação do alcaide. Prefeito, eu li na internete que o Batman está morando no Brasil. O quê?!. Digo mais: trabalhou na polícia do Rio de Janeiro. Foi preso por causa de algumas travessuras delinqüentes com um grupo de ex-companheiros da polícia à qual serviu. Um pequeno deslize, coisa perdoável. Fez como civil, inclusive sem os aparatos que o identificam.
O prefeito ficou numa saia justa. Planejava sair da reunião com a proposta amarrada, além do comício que pretendia fazer para divulgar à população como enfrentariam, mesmo de um fim de mundo daqueles, os poderosos americanos e ainda por cima o Batman, herói poderoso e muito astuto. Mas aquilo era inusitado. O Brasil, sabia assim de ouvir falar, era um país em algum lugar do continente americano ou da África? Lembrava de umas mulatas rebolando, futebol e que mais? O resto não seria só floresta? Isso complicava um pouco os planos. Será que o Batman cansou daquela escuridão de Gotham City?
O prefeito, recuperado do susto, bradou: processaremos também o Rio. Com esta decisão, a história se encaminhou para processar o Brasil, o Rio e quem mais fosse. Outro assessor sugeriu que uma comissão fizesse viagem até o Rio para conhecer o Batman. Mesmo que alguém tivesse dito que ele estava foragido, o prefeito nem ouviu. Sugeriu com entusiasmo, lembrando-se das mulatas, uma nova moção: organizaremos uma comissão especial que será enviada à cidade, para convidar o Batman para passar uma temporada na cidade. Quem sabe se ele levar umzinho não se anima e fica do nosso lado? Vamos chamar a atenção, melhorar o turismo, e fazer inveja. Vai ser nossa kriptonita contra a nossa decrépita cidade vizinha, chamada Superman.
Fonte: www.jornalpequeno.com.br (São Luís, Maranhão)
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